segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Do canavial à universidade (parte 2)

    Acostumado com o silêncio das bibliotecas e salas de estudo, o cortador de cana que foi aprovado este ano no vestibular de medicina da UPE, Jonas Lopes da Silva, viveu um dia agitado na cidade onde se criou, Joaquim Nabuco, na Zona da Mata, a 120 quilômetros do Recife. Vizinhos, amigos e parentes queriam detalhes da história do rapaz, que foi publicada no Diario de ontem. Se o caminho de Jonas coubesse em duas linhas de jornal, seria assim: iniciou e concluiu o ensino na rede pública, migrou para o Recife atrás dos sonhos, conseguiu bolsa em cursos, mudou-se para a Casa do Estudante e conquistou uma vaga no curso mais concorrido da UPE, depois de quatro anos de tentativas.
    Além de ter o momento de "fama" em Joaquim Nabuco, Jonas ganhou dois volumes dos livros que citou na matéria como fundamentais para iniciar os estudos. Um empresário dono de uma livraria no Recife ofereceu dois dos três volumes do Prometheus, Atlas de Anatomia. Cada um custa, em média, R$ 230. "Vixe, meu Deus, ainda nem acredito no que aconteceu e vem mais uma dessa?", comentou Jonas. O rapaz quer estudar antes do curso começar. "Me disseram para eu já ir folheando os livros", disse. Jonas passou na turma de 2ª entrada, cujas aulas vão iniciar somente no segundo semestre de 2010. "O outro que eu preciso ter é o Harrison - Medicina Interna. Se Deus quiser, eu vou passar no concurso do IBGE e vou investir", conta o rapaz. No início do próximo ano, Jonas poderá contar a sua história no Palácio das Princesas, onde será recebido pelo governador Eduardo Campos.
    Trabalhando de pedreiro na reforma de uma escola em Caruaru, José Lopes foi a Joaquim Nabuco, para encontrar o filho. "Nem me lembro quando senti uma felicidade igual. Nunca tive na família alguém que chegou na universidade", contou o pai, orgulhoso de dar tanta "satisfação" do filho nas ruas da cidade.
    Social - Jonas e os pais derrubaram cana em Joaquim Nabuco. O rapaz, de 24 anos, cortou dos sete aos 15. Hoje, a mão de obra do setor tem ficado sob os olhos da fiscalização e da Justiça.A atuação conjunta com algumas empresas dá importantes passos para humanizar o trabalho. Em julho deste ano, o Ministério Público do Trabalho, por meio da Procuradoria Regional do Trabalho da 6ª Região, firmou um termo de compromisso e ajustamento de conduta com 22 usinas. Entre as obrigações previstas aos empregadores estão garantir aos trabalhadores o piso salarial mínimo ou o salário mínimo; transporte; exames médicos (admissional e periódico por exemplo); oferecer ferramentas de trabalho e equipamentos de proteção individual (como facões com bainhas e luvas), além de área com instalações sanitárias e local para refeições nos casos de trabalhadores alojados. 

(Este escrevi no dia da publicação da primeira matéria, 23 de dezembro de 2009 - postada logo abaixo - e publicado no dia seguinte, no Diario de Pernambuco). 

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