segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Do canavial à universidade (parte 3 ou do canavial ao palácio)

    O Palácio do Campo das Princesas, sede do governo do estado, sempre esteve na mente do ex-cortador de cana de açúcar, Jonas Lopes da Silva, 24 anos. Ele conhecia o prédio histórico nos livros e de longe, na Praça da República.

O ex-cortador de cana foi recebido como um ilustre convidado pelo governador Eduardo Campos. Jonas ganhou de presente a camisa da universidade . Foto: Edvaldo Rodrigues/DP/D.A/Press
 Com os amigos imaginários (pernambucanos ilustres como Josué de Castro e Joaquim Nabuco), Jonas conversava sobre o que significava justiça e dignidade ali dentro. Até que ontem, o ex-trabalhador rural que estudou sempre na rede pública e foi aprovado no vestibular de medicina da UPE deste ano, pisou no tapete vermelho do palácio. Foi recebido pelo governador Eduardo Campos. Ganhou homenagens ao lado da mãe, Edileuza Lopes, de 50 anos, também trabalhadora rural do município de Joaquim Nabuco, na Zona da Mata, a 120 quilômetros do Recife.
    Diante do governador, da secretária de Ciência e Tecnologia Luciana Santos, do reitor da UPE, Carlos Calado, do prefeito de Joaquim Nabuco, João Carvalho, e outras "autoridades", Jonas recontou a sua história, publicada no Diario do último dia 23. O rapaz deu aula. Para começo de conversa, reproduziu a frase de outro "amigo" que inspirou o seu feito: "o menino é o pai do homem" (Machado de Assis, em Conto de escola). Quando menino, Jonas cortou cana. Sentiu o dissabor do trabalho duro. Chegou a parar de estudar por dois anos. A mãe lhe cobrou ser homem na vida por meio dos livros. "Se ele não queria estudar, colocava ele no campo, para saber o que era que eu sofria", disse a mãe, que desde os 15 anos colheu cana.
    Desde que a sua história ficou conhecida, Jonas vem recebendo apoio. De "futuros colegas" e solidários da luta do rapaz. Ontem, ele ganhou da Livraria Jaqueira dois, dos três volumes do Prometheus - Atlas de anatomia. Também recebeu um notebook do prefeito João Carvalho. Pelos corredores do palácio, foi chamado de "futuro doutor" e já agendou consultas. Jonas quer ser cardiologista. O rapaz aguarda ainda o resultado do concurso para agente do IBGE, no dia 20 de janeiro. Se aprovado, diz ele, vai usar a remuneração para reformar a casa da famíliae comprar mais livros. As aulas de medicina terão início no segundo semestre de 2010. "Tem o Harisson, que eu quero comprar em inglês", sonha Jonas com os dois volumes do Harisson - Medicina interna (que custam R$ 500).
    "É muito importante esse testemunho de valorização da educação, de que não existem barreiras insuperáveis para se buscar os objetivos. As dificuldades são muitas, mas ele mostrou que é possível vencê-las. Sua vida serve de exemplo para muitos outros jovens", defendeu o governador. Eduardo Campos destacou ainda que, como Jonas, outras crianças e jovens dão exemplos no interior do estado. "Lembro do menino João Lucas, de Quixaba, no Sertão, que conquistou três medalhas de ouro seguidas na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas", comentou. "Fica evidente que as nossas universidades têm que ir em direção do interior", afirmou. 
(Este escrevi no dia 30 de dezembro de 2009 e foi publicado no dia seguinte, no Diario de Pernambuco).

Um comentário:

Paula Brasileiro disse...

É ótimo o reconhecimento que esse rapaz vem recebendo e todo o apoio material e emocional, também. Ele merece. Só fico me perguntando uma coisa. Essa politicada toda que aproveita pra sorrir ao lado de um rapaz desse que vem vencendo às próprias custas na vida... Pq eles não aparecem antes, sorrindo pra educação de base, trabalhando com mais firmeza contra o trabalho infantil? Sorrir na foto depois que o cara se lascou todo sozinho pra conseguir êxito é mt fácil. aii, meu Brasil varonil...não tem jeito!